Hugo, algumas considerações sobre a tua morte que se aproxima:
Não quero que partas desta
vida sem antes nos despedirmos, porque tens feito um mal imenso a muita gente,
tens arruinado famílias inteiras, tens obrigado legiões de compatriotas a emigrar
para outras terras, tens enlutado um número incontável de lares, aos que
achavas que eram teus inimigos os perseguistes sem quartel, os aprisionastes em
cubículos indignos até para animais, os insultastes, os humilhastes, os
enganastes, não só porque te achavas poderoso, mas também imortal... Porque o
fim dos tempos não te alcançaria.
Mas a tua hora chegou, os prazos se esgotaram, o teu contrato
chega ao seu fim, teu "ciclo vital" se apaga pouco a pouco e não da
melhor maneira; provavelmente morrerás numa cama, rodeado de tua família,
assustada, porque vais ter que prestar contas uma vez que das teu último
alento, te vás desta vida cheio de angustia e de medo, lá vão estar os padres a
quem perseguistes e insultastes, os representantes dessa Igreja que ultrajastes
por prazer, claro que te vão dar a extrema unção e os santos óleos, não uma,
mas muitas vezes, mas tu e eles sabem que não servirão para nada, mas só para
acalmar o pânico a que está presa a tu alma ante o momento que tudo define.
Morres enfermo, padecendo do despejo, das complicações
imunológicas, dos terríveis efeitos secundários das curas que prometeram
alongar a tua vida, teus órgãos vão se deteriorando, uma a um, tuas faculdades
mentais vão perdendo o brilho que as caracterizava, teus líquidos e fluidos são
coletados em bolsas plásticas com esse fedor de morte que tanto te repugna.
Diga-me, neste momento, antes que te apliquem uma nova injeção
para acalmar as dores insuportáveis de que padeces, vale a pena que me digas
que não te possam tirar a dança – ah! – as viagens pelo mundo, os maravilhosos
palácios que te receberam, as paradas militares em tua honra, as limusines, os
títulos honoríficos, os pisos dos hotéis cinco estrelas, as faustosas cenas de
estado... Diga-me agora que vomitas o mingau de abóbora que as enfermeiras te
dão na boca, se era sobre isso que se tratava a vida, pois os brilhos e as
lantejoulas já não aprecem nos monitores e máquinas de ressuscitação que te
rodeiam, as marchas e os aplausos agora são meros bipes e alarmes dos sensores
que regulam teus sinais vitais que se tornam mais débeis.
Podes escutar o povo do teu país lá fora do teu quarto?... Deve
ser tua imaginação ou os efeitos da morfina, não estás na tua pátria, estás em
outro lado, muito distante, entre gente que não conheces... Sim, estás morrendo
em teu próprio exílio, entre um bando de moleques a quem confiou entregar teu
próprio país, teus últimos momentos serão passados entre cafetões e vigaristas,
entre a tua coorte de aduladores que só te mostram afeto porque lhes davas
dinheiro e poder; todos te olham preocupados e com raiva, nunca deixastes que
nenhum deles pudesse ter a oportunidade de te suceder; agora os deixas ao
desabrigo e teu país à beira de uma guerra civil... Era isso o que querias? Foi
essa a tua missão nesta vida? Esquece-te da quantidade de pobres, agora há mais
pobres do que quando chegastes ao poder; esquece-te da justiça e da igualdade
quando praticamente lhe entregastes o país a uma força estrangeira que agora
teremos de desalojar à força e ao custo de mais vidas.
Tenho a leve impressão que agora sabes que te equivocastes;
acreditastes num conto de passagem e te julgastes revolucionário, e por ser
revolucionário... imortal; convocastes para o teu lado os mortos, teus heróis,
esses fantasmas que também julgavas ter vida, Bolívar, Che Guevara, Fidel, e
Marx que nunca conhecestes e que recomendavas a sua leitura... Andar com mortos
te levou à magia e aos babalaôs, te metestes a violar sepulturas, e a fazer
oferendas a uma coorte de demônios e espíritos maus que agora te acompanham...
Sentes a presença deles no quarto? Estão vindo te cobrar, recolher a única
coisa que deverias valorizar em tua vida e que tão sinistramente atirastes na
obscuridade e no mal, a tua alma.
Bem, me despeço; só queria que soubesses que passarás para a
história do teu país como um traidor e um covarde, por não teres retificado tua
conduta quando pudestes e te deixastes levar por tua soberba, por teus ideais
equivocados, por tua ideologia sinistra renunciando aos valores mais
apreciados, a tua liberdade e à liberdade dos outros, e a liberdade nos torna
mais humanos.
"O socialismo só funciona em dois lugares: no céu, onde não
precisam dele, e no inferno onde é a regra dos que sofrem".
Nancy Iriarte Díaz
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